23/05/2025
Autor : Gianpaulo Scaciota
Data de Produção: 24/03/2025
O presente texto, artigo e ou opinião não tem a presunção de diminuir a importância das nossas leis, códigos, normas ou regramentos, mas trazer à baila a discussão do marasmo, demora e falta de adequação das mudanças em nosso ordenamento jurídico pelo legislador em contraponto ao que ocorre pela e com a sociedade.
Um exemplo que cito como Advogado atuante (esse ano faço 30 anos de formado pela Universidade Mackenzie) é o Código de Defesa do Consumidor, Lei 8.078 de 1990, e imaginem vocês, quando comecei a atuar o CDC era legislação recém saída do forno e eu ávido em aplicar o novo instrumento criado em favor do jurisdicionado consumidor, pois bem, lembro-me como se fosse hoje a dificuldade e a não recepção dos juízes ao artigo 84 do CDC, o texto de lei, claro, indicando a possibilidade de concessão de tutela, era como se o texto da lei não existisse e ou fosse coisa e outro mundo. Hoje passados mais de 30 anos, todo mundo conhece seus direitos enquanto consumidor, e os juízes aplicam o CDC de forma pacífica.
Outra questão apenas para dar gosto ao tema e sua provocação, já em 2008 quando na sabatina preparatória de minha tese de Mestrado falando sobre formas alternativas de solução de conflitos, me vi surpreso com a reação de uma juíza que participou da banca provisória quando dissertei sobre a possibilidade de composição na área trabalhista por meio de mediação e ou arbitragem, com critica veemente, e não por uma impugnação técnica, mas por desconhecer a matéria em si.
Em 2017 com a reforma, 9 (nove) anos passados da minha defesa de tese, com a Reforma Trabalhista: Art. 507-A. Nos contratos individuais de trabalho cuja remuneração seja superior a duas vezes o limite máximo estabelecido para os benefícios do Regime Geral de Previdência Social, poderá ser pactuada cláusula compromissória de arbitragem, desde que por iniciativa do empregado ou mediante a sua concordância expressa, nos termos previstos na Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996 (Red. L. 13.467/17)
Isso coincide com a minha avaliação de demora do legislador em se adequar às transformações da sociedade e da necessidade da mínima interferência estatal na relação entre as partes, mas isso é um capítulo à parte.
Agora em 2024 presenciamos com alarde (e vou me ater ao capítulo Condomínio Edilício) a apresentação, de proposta de Reforma do Código Civil, o que pasme, gerou manifestação de Ministro do STF, falando que é difícil ter segurança jurídica, pela revisão de um Código de mais de 20 anos, enquanto a corte em período de pouco mais de 3 (três) anos, mudou posicionamento sobre cumprimento de pena, trânsito em julgado após segunda instância, que, independentemente da análise individual sobre o tema, mudou uma eleição e o destino do País.
O Código Civil de 2002, cuida do Condomínio Edilício em 29 artigos, do 1331 ao 1358, e as mudanças propostas pelo anteprojeto, smj, em sua maioria inócuas (questões já resolvidas pela sociedade e ou poder judiciário) ou, no meu ver, intromissão indevida do Estado, por meio de lei, na discricionariedade privada.
Mas vamos nos fixar na proposta de majoração da multa de 2% para 10% por atraso no pagamento das contribuições mensais.
Redação atual do artigo 1.336, parágrafo 1º do Código Civil:
“§ 1º O condômino que não pagar a sua contribuição ficará sujeito aos juros moratórios convencionados ou, não sendo previstos, os de um por cento ao mês e multa de até dois por cento sobre o débito.
Proposta da Relatoria do Projeto de Reforma:
“§2º. O condômino que não pagar os valores do rateio ordinário ou extraordinário de despesas, ou aquele que não fizer o reembolso de valores a que foi condenado a pagar ao condomínio, a qualquer título, ficará sujeito aos juros moratórios convencionados ou, não sendo previstos, aos juros estabelecidos no artigo 406 deste Código, bem como à multa de até dez por cento sobre o débito, sendo vedada a estipulação de cláusula de desconto em razão da antecipação de pagamento.
Ou seja, está se propondo a majoração da multa sobre o débito (contribuição ordinária ou extraordinária inadimplida) de 2% para 10%. O que na minha análise de advogado e consultor atuante no mercado condominial, não só é um equívoco, como um erro, explico:
Conforme matéria publicada no site G1 no final de 2024: “A inadimplência da taxa de condomínio em São Paulo atingiu em outubro, em média, 12,53%. Este é o nível mais elevado registrado para o estado em 2024”.
Ora imaginar que aumentando a “penalidade” pelo atraso se terá resultados positivos é um paralogismo, nesse universo considerado a taxa média de 12,53%, a grande maioria é devedor por necessidade e não por capricho (pois é cediço que existem pessoas que “podem” pagar, mas em razão da multa baixa, investem ou direcionam seus recursos para outras prioridades).
Aumentar a multa, no meu entendimento ira gerar uma crise sem precedentes, inclusive social, com mais imóveis eventualmente indo a leilão, no caso dos inadimplentes “de necessidade” e punindo o inadimplente pontual, desnecessariamente (aquele que atrasou alguns dias e paga, de imediato, assim que possível e com a multa de 10% provavelmente atrase mais).
E é curioso que já existe no próprio Código Civil de 2002, penalidade “pesada” para punir o inadimplente contumaz seja aquele que não tem condições de permanecer no imóvel e “imagina” que não perde o imóvel pois é “bem de família” seja aquele que prefere comprar um carro novo, uma viagem e utiliza o débito do Condomínio em sua engenharia financeira, preferindo pagar cartão de crédito por exemplo.
Logo, não há razoabilidade na majoração da multa de 2% para 10% analisando a questão da inadimplência em Condomínios, seja porque Condomínio não visa lucro e ou o intuito deva ser a penalização do inadimplente, ainda também não se faz razoável, pois, por corolário lógico, aquele que já esta com dificuldade de honrar com os pagamentos com multa de 2%, em muitos dos casos aplicada a multa de 10% levará a impossibilidade de quitação e a perda do imóvel, contribuindo para desarranjo da coletividade e aumento de pessoas sem moradia.
De outro lado a inadimplência contumaz e ou o condômino nocivo (pode e não paga e ou destina seus recursos a outros bens e serviços) pode e DEVEM ser utilizados os dispositivos já EXISENTES, nos artigos 1336 e 1337 do Código Civil.
Concluindo o raciocínio a majoração da MULTA por atraso no pagamento das contribuições condominiais, NÃO irá resolver o problema da inadimplência, no meu estudo, irá agravar, contribuindo para o caos social e privado, e penalizando o inadimplente pontual, sendo que já EXISTE mecanismo no caso de inadimplência contumaz ou nociva.
Por fim, algo que defendo é a mínima interferência estatal e por serem os Condomínios vinculados à propriedade privada e cada qual com sua especificidade, com ocupações diferenciadas de pessoas e características diversas, sociais, culturais e financeiras, por que não estabelecer um parâmetro mínimo e máximo de multa e cada condomínio definir o que é melhor para si?
Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da AASP .
Gianpaulo Scaciota
Minibio: Advogado. Mediador Certificado pelo IASP. Mestre em Direito pela Fadisp. Pós-Graduando PUC/RS Direito Digital.